terça-feira, 29 de abril de 2025

SENTENÇA – CRIME AMEAÇA – VIOLÊNCIA CONTRA MULHER – ART. 147, CP – APLICAÇÃO DA LEI Nº 11.340/2006 (êxito advregis)

 


SENTENÇA

 

Processo: 1000573-75.2023.8.11.0020

 O MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE MATO GROSSO, por intermédio de seu representante nesta Comarca, ofereceu denúncia em desfavor de LUAN FELÍCIO FRANCELINO, já devidamente qualificado nos autos, imputando-lhe a prática do crime tipificado no artigo 147, caput, do Código Penal, com as cominações da Lei Federal nº 11.340/2006. 

 Emerge da incoativa que: “(...) no dia 09 de fevereiro de 2023, por volta das 13h30min, na Rua E, s/n, Bairro Maria das Graças, Município de Alto Araguaia/MT, Luan Felício Francelino ameaçou, por palavra, a Sra. Silvana Jessica Vicente Breda, sua ex-companheira, de causar-lhe mal injusto e grave. (...)”.

 Concluídas as investigações, o MPE ofereceu denúncia (id. 158864933), cujo recebimento se deu em 13.06.2024 (id. 158897379). Citado, o acusado, por intermédio de defensor constituído, apresentou resposta à acusação (id. 160133161).

 No curso da instrução, foi realizada a oitiva da vítima, testemunhas e interrogatório do acusado (id. 186656903).

 Encerrada a instrução criminal, o Parquet apresentou alegações orais, ocasião em que postulou pela condenação do acusado, nos termos da exordial acusatória, acrescentando a reprovabilidade da conduta em razão do uso de bebida alcoólica pelo acusado e também pelo ciúme exacerbado, pelo que requereu a majoração da pena nas 1ª e 2ª fase dosimétrica (id. 186641126).

A defesa, por sua vez, fundamentando no princípio favor rei, a seu ver aplicável ao caso em razão da ausência de outros elementos probatórios, requereu a absolvição do acusado. Alternativamente, requereu a fixação da pena no seu patamar mínimo (id. 187476403).

 É o relatório. 

Decido. 

 

Considerando a ausência de preliminares e presença dos demais pressupostos processuais, passa-se à análise do mérito.

 

materialidade delitiva resta demonstrada pelo boletim de ocorrência anexo aos autos (id. 113691320, fls. 02/03), bem como pelo relatório policial, o qual foi incluído sob o id. 113691319. A autoria, por seu turno, restou comprovada pela prova oral produzida nas duas etapas da persecução penal.

 A informante Antônia Vicente declarou na solenidade que: (...) emprestou seu telefone a Luan, uma vez que ele disse que iria ligar para sua mãe; não ouviu as ameaças, visto que Luan se foi para baixo de algumas árvores; sua filha Silvana questionou se ela havia emprestado o celular a Luan e informou que ele havia a ameaçado. (...)– termos gravados em mídia digital. 

 A vítima Silvana Jessica Vicente Breda apresentou declarações harmônicas entre si nas duas fases da persecução penal. Em Juízo a ofendida relatou que: “(...) foi ameaçada, mas não se recorda sobre o teor das ameaças; teve outra situação na qual ele a ameaçou pessoalmente com faca; tem medida protetiva contra o réu; possuem filhos em comum; (...)” – termos gravados em mídia digital. 

 A testemunha José Alfredo Gomes de Oliveira, Policial Civil, declarou que: “(...) confeccionou o boletim de ocorrência para Silvana, que dizia que o acusado estava injuriando ela e a ameaçando; Silvana informou já ter outras medidas protetivas o réu; (...)” – termos gravados em mídia digital. 

 Por sua vez, quando interrogado em Juízo, o acusado Luan Felicio Francelino afirmou não se recordar da prática delitiva, destacando que: “(...) se tivesse feito isso, ela não teria passado 3 (três) dias em Sinop/MT em sua residência; não sabe do porquê dela ter registrado boletim de ocorrência; foi para Sinop/MT trabalhar quando já estava separado dela há mais o menos 2 meses; (...)” – termos gravados em mídia digital.

 Diante do exposto, o conjunto probatório, obtido em observância aos princípios do contraditório e da ampla defesa, revela-se consistente no tocante à autoria delitiva, notadamente porquanto a versão da vítima foi uníssona nas duas etapas da persecução penal, no sentido de que o acusado proferiu as ameaças contra ela, fazendo com que ela temesse pela própria vida.

 Além disso, importante registrar que em crimes dessa natureza, concede-se especial relevo à palavra da vítima, possuindo credibilidade e valor relevante à condenação quando corroboradas pelas demais provas dos autos, o que ocorreu no presente feito, quando a vítima confirmou em Juízo as ameaças narradas em solo inquisitivo.

 

Cediço que a ameaça é um crime que se consuma no momento em que ocorre, independentemente de se concretizar o dano que o agente pretende. Para que o crime seja caracterizado é suficiente que a ameaça de mal injusto e futuro seja séria e adequada, provocando medo na vítima.

 Eis o entendimento jurisprudencial: “RECURSO DE APELAÇÃO CRIMINAL – AMEAÇA – VIOLÊNCIA CONTRA MULHER – ART. 147, CP – APLICAÇÃO DA LEI Nº 11.340/2006 – INDIVÍDUOS QUE SÃO APARENTADOS – ACUSADO QUE É IRMÃO DO OFENDIDO E CUNHADO DA OFENDIDA – RECURSO DA DEFESA – PRETENSÃO ABSOLUTÓRIA – INSUFICIÊNCIA DE PROVAS – INOCORRÊNCIA – ACUSADO QUE ADMITIU TER ENCAMINHADO MENSAGENS DE ÁUDIOS ÀS VÍTIMAS – DEPOIMENTOS COESOS DAS VÍTIMAS – RECURSO DESPROVIDO. 1. A ameaça é crime formal, sua caracterização dispensa a comprovação da intenção final do agente sendo suficiente a presença do dolo específico de incutir temor à vítima. 2. Inobstante o apelante sustente que os supostos áudios enviados às vítimas com conteúdo intimidador não foram acostados ao feito, o acusado afirmou que enviou áudios aos ofendidos “falando algumas bobagens”, afirmando que foram “da boca pra fora, que jamais tentaria alguma coisa contra a vida dos dois”.  3. O estado de exaltação do agente não possui o condão de excluir a imputabilidade penal em razão do estado colérico do agente (ART. 28, I, CP). 4. Na ocasião, a palavra da vítima está corroborada pelas declarações do próprio acusado, reforçando o que foi narrado na peça acusatória, mostrando-se, portanto, escorreita a sentença recorrida.  (N.U 1001119-81.2020.8.11.0038, CÂMARAS ISOLADAS CRIMINAIS, MARCOS REGENOLD FERNANDES, Segunda Câmara Criminal, Julgado em 02/07/2024, Publicado no DJE 05/07/2024).

 Assim, restou sobejamente demonstrada a prática do crime de ameaça no âmbito das relações domésticas.

 Portanto, comprovada a materialidade e autoria delitiva, bem ainda não existindo quaisquer causas excludentes de antijuridicidade ou culpabilidade, pois o réu era imputável à data do fato típico, possuía potencial consciência da ilicitude e era exigível conduta diversa, restando consubstancialmente comprovada à existência da culpabilidade, merece acolhimento à pretensão acusatória neste ponto.

 Ante o exposto, com base na motivação supra, JULGO PROCEDENTE a exordial acusatória, para CONDENAR LUAN FELÍCIO FRANCELINO nas sanções do artigo 147, caput, do Código Penal, com as cominações da Lei Federal n. 11.340/2006.

 Fulcrado no princípio da individualização das penas e atento às diretrizes do artigo 59 do Código Penal, passo à dosimetria da reprimenda.

 

Na primeira fase, a culpabilidade revela-se normal à espécie, eis que o acusado não agiu com dolo que ultrapasse os limites da norma penal. Os antecedentes são favoráveis, uma vez que o acusado é primário (consulta ao Sistema de Emissão de Certidão). A conduta social e a personalidade sem elementos nos autos para valorá-las. Os motivos e as circunstâncias do crime são punidos pelo próprio tipo penal. As consequências do crime são normais à espécie, não exigindo maior reprimenda do que aquela já fixada pelo legislador. Por fim, o comportamento da vítima demonstra-se neutro, não requer valoração extrapenal.

 Dessa maneira, fixa-se a pena base em 01 (um) mês de detenção.

Na segunda fase, inexistem circunstâncias agravantes ou atenuantes a serem consideradas.

 Na terceira fase, inexistem causas de aumento ou de diminuição, pelo que fixo a reprimenda definitiva em 01 (um) mês de detenção.

Em tempo, não se mostra adequada a exacerbação da pena em razão da embriaguez do sentenciado ou em decorrência de ciúme excessivo, eis que não foi explorado no curso da persecução penal eventual estado de embriaguez do ofensor. Ainda, o ciúme excessivo não foi ressaltado, na medida em que ocorreu a ameaça, que não se concretizou, e não houve na circunstância qualquer situação que mereça valoração negativa, porque o contexto já é ínsito ao texto legal.

 O regime prisional inicial deve ser o aberto, nos termos do artigo 33, § 2º, alínea “c”, do Código Penal.

 Não cabe a substituição da pena privativa de liberdade por restritivas de direitos, pois o crime em apreço foi cometido com violência e grave ameaça, não cumprindo, assim, o requisito do artigo 44, inciso I, do Código Penal. Do mesmo modo, deixo de conceder a suspensão condicional da pena por ser o tempo de tal medida mais grave que a própria pena aplicada.

 Considerando a pena aplicada e o regime empregado, concedo ao réu o direito de recorrer em liberdade, na medida em que inexistem os requisitos preventivos do artigo 312 do CPP.

 Condeno-o ao pagamento de custas e despesas processuais.

 No concernente à reparação de danos, o art. 387, inciso IV, do CPP, estabelece que nas sentenças penais condenatórias será fixado valor mínimo para reparação dos danos causados pela infração penal. No caso dos autos, trata-se de violência doméstica perpetrada contra a mulher, os danos são in re ipsa, ou seja, presumido em razão da natureza do abalo.

 Posto isso, estabeleço o valor de meio salário mínimo vigente na época dos fatos, equivalente ao montante de R$ 660,00 (seiscentos e sessenta reais) a título de danos morais em favor da ofendida.

 Intime-se a vítima na forma do artigo 201, § 2º, do Código de Processo Penal.

 Após o trânsito em julgado, expeça-se guia de execução penal definitiva e encaminhe-se ao juízo de execução competente. Comuniquem-se ao Tribunal Regional Eleitoral, para fins do artigo 15, inciso III, da Constituição Federal, aos Institutos de Identificação Criminal e ao Cartório Distribuidor desta Comarca para as anotações pertinentes, arquivando-se, em seguida, os presentes autos com as cautelas de estilo. 

 Publique-se. Registre-se. Intimem-se.

 Alto Araguaia/MT, data da assinatura digital. 

  DANIEL DE SOUSA CAMPOS  

Juiz de Direito  

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