ESTADO DE MATO GROSSO
PODER JUDICIÁRIO
VARA ÚNICA DE APIACÁS
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DECISÃO
Processo: 1000527-93.2020.8.11.0084.
EXEQUENTE: IRINEU CARLOS ANGONESE (adv. Régis Rodrigues Ribêiro)
EXECUTADO: NEURI SILVEIRA
Vistos.
Trata-se de execução ajuizada por Irineu Carlos Angonese contra Neuri Silveira, qualificados nos autos.
A inicial foi recebida ao Id. 41817666, determinando a citação do executada para efetuar o pagamento da dívida.
Citação frutífera ao Id. 104499695.
O exequente requereu a penhora de imóvel urbano, sendo deferido ao Id. 117468622.
Auto de penhora e avaliação aportado ao Id. 194760524.
O executado opôs embargos a execução ao Id. 196946531.
Houve impugnação pela parte exequente ao Id. 197660091.
Ao Id. 205789344 a parte executada reiterou o pedido.
É o relato do necessário.
Decido.
Na hipótese dos autos, o executado apresentou ao Id. 173707253 embargos a execução, na forma de petição, almejando a discussão do título executivo extrajudicial, sem se atentar que deveria proceder á distribuição do feito.
Art. 914, § 1º, do CPC, assim dispõe:
“Art. 914. O executado, independentemente de penhora, depósito ou caução, poderá se opor à execução por meio de embargos.
§ 1º Os embargos à execução serão distribuídos por dependência, autuados em apartado e instruídos com cópias das peças processuais relevantes, que poderão ser declaradas autênticas pelo próprio advogado, sob sua responsabilidade pessoal.”
Referido dispositivo prevê, de forma clara, que os embargos á execução comportam distribuição por dependência (ação autônoma), autuação em apartado e instrução com cópia das principais peças da execução.
Além disso, verifico a intempestividade dos embargos á execução.
Explico.
Os embargos á execução devem ser oferecidos no prazo de 15 (quinze) dias, contados da data da juntada aos autos do mandado de citação, nos termos do arts. 915 e 231, II, do CPC, que dispõem:
Art. 915. Os embargos serão oferecidos no prazo de 15 (quinze) dias, contado, conforme o caso, na forma do art. 231 .
Art. 231. Salvo disposição em sentido diverso, considera-se dia do começo do prazo:
(...)
II - a data de juntada aos autos do mandado cumprido, quando a citação ou a intimação for por oficial de justiça;
No caso em apreço, o executado foi citado em 14/11/2022, sendo aportado no feito o mandado no dia 21/11/2022 (Id. 104499695) e após o transcurso do prazo legal, o executado opôs embargos a execução (09/06/2025 – Id. 196946531).
Assim, diante da intempestividade dos embargos a execução, resta prejudicado a análise das demais matérias suscitadas no mérito.
No entanto, em relação a alegação de impenhorabilidade do bem de família, por ser matéria de ordem pública, pode ser alegada em qualquer tempo e grau de jurisdição, desde que não havido precedente apreciação do juízo acerca da questão, como se verifica na hipótese em cotejo.
Nesse sentido, o Superior Tribunal de Justiça orienta “que a impenhorabilidade de bem de família é matéria de ordem pública, suscetível de análise a qualquer tempo e grau de jurisdição, operando-se a preclusão consumativa somente quando houver decisão anterior acerca do tema” ( AgInt no REsp 1639337/MG, Rel. Min. Marco Buzzi, Quarta Turma, julgado em 19/10/2020, DJe 23/10/2020).
Por sua vez, embora o meio processual utilizado pelo executado para livrar o imóvel da penhora não fosse o mais adequado, porquanto deveria ou poderia ter apresentado sua impugnação por simples petição nos autos da execução, justifica-se sua análise em homenagem ao princípio da instrumentalidade das formas.
A propósito:
ESTADO DE MATO GROSSO TRIBUNAL DE JUSTIÇA QUARTA CÂMARA DE DIREITO PRIVADO APELAÇÃO CÍVEL (198) Nº 0001720-95.2014.8.11 .0012 APELAÇÃO – EMBARGOS À EXECUÇÃO – PENHORA DE IMÓVEL – IMPENHORABILIDADE DO BEM DE FAMÍLIA RECONHECIDA – INTEMPESTIVIDADE – AFASTADA - MATÉRIA DE ORDEM PÚBLICA – PRINCÍPIO DA INSTRUMENTALIDADE DAS FORMAS – RECEBIMENTO COMO SIMPLES PETIÇÃO – AFASTAMENTO DA CONDENAÇÃO EM HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS – RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO. Em se tratando de matéria de ordem pública, a alegação de impenhorabilidade do imóvel que serve de moradia ao devedor e à sua família pode ser alegada a qualquer tempo e grau de jurisdição, desde que não havido precedente apreciação do juízo acerca da questão. Embora os embargos à execução não sejam o meio adequado para afastar a penhora de bem de família, justifica-se sua análise em homenagem ao princípio da instrumentalidade das formas. Se a impenhorabilidade de bem de família pode ser alegada em simples petição nos autos, a desnecessária oposição de embargos não acarreta a condenação do embargado ao pagamento da verba sucumbencial . (TJ-MT 00017209520148110012 MT, Relator.: GUIOMAR TEODORO BORGES, Data de Julgamento: 08/09/2022, Quarta Câmara de Direito Privado, Data de Publicação: 08/09/2022).
A Lei 8.009/1990, orienta que será reconhecida a impenhorabilidade do imóvel que sirva de moradia do devedor ou a entidade familiar:
Art. 1º O imóvel residencial próprio do casal, ou da entidade familiar, é impenhorável e não responderá por qualquer tipo de dívida civil, comercial, fiscal, previdenciária ou de outra natureza, contraída pelos cônjuges ou pelos pais ou filhos que sejam seus proprietários e nele residam, salvo nas hipóteses previstas nesta lei.
Parágrafo único. A impenhorabilidade compreende o imóvel sobre o qual se assentam a construção, as plantações, as benfeitorias de qualquer natureza e todos os equipamentos, inclusive os de uso profissional, ou móveis que guarnecem a casa, desde que quitados.
(...) Art. 5º Para os efeitos de impenhorabilidade, de que trata esta lei, considera-se residência um único imóvel utilizado pelo casal ou pela entidade familiar para moradia permanente.
Assim, para que se reconheça a impenhorabilidade do bem de família é indispensável a demonstração de que ele é utilizado pela entidade familiar para moradia permanente e, caso haja mais de um imóvel residencial, a impenhorabilidade alcança, em regra, o de menor valor.
Na hipótese, o executado não trouxe aos autos provas concretas suficientes para demonstrar o efetivo uso do imóvel como residência familiar. Não foram juntados documentos que comprovassem de forma inequívoca que ele reside no imóvel.
Pelo contrário, a procuração outorgada ao advogado, consta endereço diverso daquele do imóvel penhorado, documentos que contradizem a sua alegação de que o imóvel seria sua residência habitual.
Logo, em que pese o esforço do executado em argumentar a respeito da impenhorabilidade, cabe destacar que o ônus da prova é da parte que alega o direito e, no caso, denota-se que o executado não se desincumbiu de provar que o imóvel penhorado é utilizado como sua moradia principal e, por consequência, não preenche os requisitos da Lei 8.009/90 para ser considerado bem de família impenhorável.
Nesse sentido:
“DIREITO CIVIL. AGRAVO DE INSTRUMENTO. EXECUÇÃO. PENHORA DE IMÓVEL. ALEGAÇÃO DE IMPENHORABILIDADE. BEM DE FAMÍLIA. AUSÊNCIA DE PROVAS DO USO RESIDENCIAL. LEI 8.009/90. IMPENHORABILIDADE NÃO CONFIGURADA. RECURSO NÃO PROVIDO. (...) A Lei nº 8.009 9/90 dispõe que o imóvel utilizado como residência permanente da entidade familiar é impenhorável. Entretanto, cabe ao devedor demonstrar que o bem atende aos requisitos para tal proteção. A agravante não apresentou provas suficientes de que o imóvel penhorado é utilizado como sua residência habitual. Pelo contrário, documentos nos autos, como a cédula de crédito bancário, indicam que a agravante informou endereço diverso daquele do imóvel penhorado, o que contraria sua alegação de uso residencial do bem. A jurisprudência é pacífica ao exigir a comprovação inequívoca do uso do imóvel como residência familiar para que se aplique a proteção da impenhorabilidade do bem de família. Não tendo a agravante se desincumbido de seu ônus probatório, não há como reconhecer a impenhorabilidade do imóvel (...)” (N.U 1025200-72.2024.8.11.0000, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PRIVADO, SERLY MARCONDES ALVES, Quarta Câmara de Direito Privado, Julgado em 06/11/2024, Publicado no DJE 07/11/2024)
“RECURSO DE AGRAVO DE INSTRUMENTO – EXECUÇÃO DE TÍTULO EXECUTIVO EXTRAJUDICIAL – PENHORA DE IMÓVEL – ALEGADA IMPENHORABILIDADE – BEM DE FAMÍLIA – ÚNICO IMÓVEL – NÃO COMPROVAÇÃO – DECISÃO MANTIDA - RECURSO DESPROVIDO. Para que o imóvel seja caracterizado como bem de família, recebendo a proteção da impenhorabilidade, nos termos da Lei n.º 8.009/90, deve a parte executada comprovar que o imóvel é o único de sua propriedade e destinado à residência própria e de sua família. Se não comprovada a alegada condição de bem de família, não há falar em impenhorabilidade do imóvel objeto de constrição judicial.” (N.U 1022142-61.2024.8.11.0000, CÂMARAS ISOLADAS CÍVEIS DE DIREITO PRIVADO, MARILSEN ANDRADE ADDARIO, Segunda Câmara de Direito Privado, Julgado em 23/10/2024, Publicado no DJE 29/10/2024)
Diante da ausência de provas que demonstrem de forma cabal o uso residencial do imóvel, não há como reconhecer a impenhorabilidade com base na Lei 8.009/90, devendo a penhora do referido imóvel ser mantida.
Em face do exposto, com fulcro no art. 918, inciso I, do Código de Processo Civil, REJEITO os embargos à execução por intempestividade e inadequação da via eleita, bem como MANTENHO a penhora do imóvel realizada nos autos, conforme os fundamentos expostos acima.
Diante do não reconhecimento da impenhorabilidade, certo é que a penhora poderia ser impugnada por simples petição nos autos da execução (via adequada, no caso) e, dessa forma não haveria sucumbência, de modo que não há que se falar na incidência de verba honorária na presente hipótese.
Nesse sentido:
AGRAVO REGIMENTAL. EMBARGOS À EXECUÇÃO. INDICAÇÃO DE BEM DE FAMÍLIA PELO EXEQUENTE. PRINCÍPIO DA CAUSALIDADE. ÔNUS SUCUMBENCIAIS. - Se a impenhorabilidade de bem de família pode ser alegada em simples petição nos autos, a desnecessária oposição de embargos não acarreta a condenação do embargado ao pagamento da verba sucumbencial, se este de pronto concorda com o levantamento da constrição. Precedentes. ( AgRg no REsp 844.766/DF, Rel. Ministro HUMBERTO GOMES DE BARROS, TERCEIRA TURMA, julgado em 12/02/2008, DJe 23/06/2008)
Embargos à execução - Penhora de imóvel residencial – Insurgência do embargante – Impenhorabilidade do bem de família reconhecida – Afastamento da condenação da embargada ao pagamento do ônus da sucumbência – Admissibilidade – Impugnação à penhora que poderia ser feita por simples petição nos autos da execução, o que implicaria em ausência de condenação na verba sucumbencial – Verba sucumbencial afastada – Recurso improvido. (TJSP; Apelação Cível 1003358-59.2019.8.26.0108; Relator (a): Thiago de Siqueira; Órgão Julgador: 14ª Câmara de Direito Privado; Foro de Cajamar - 1ª Vara Judicial; Data do Julgamento: 21/07/2022; Data de Registro: 21/07/2022)
Sem custas.
Com a preclusão desta decisão, intime-se a parte exequente para requerer o que entender de direito no prazo de 15 (quinze) dias.
Cumpra-se, expedindo o necessário.
Apiacás, data registrada no sistema.
Lawrence Pereira Midon
Juiz e Direito